Hoje, escolhemos para os nossos leitores dois
inspirados poemas do livro “Produto Interno Líquido” de José Jorge Letria. Quem
sabe se para alguns vai ser mesmo uma surpresa tomarem contacto com a poesia
deste autor. Se acaso pretenderem conhecer um pouco mais a seu respeito apenas tereis que
clicar aqui.
E agora, amigos tem lugar a poesia:
OS FILHOS
Os filhos estão sempre de partida, já não ficam,
cresceram, têm pressa, têm as suas vidas,
entram e saem, já não se lembram da cor
dos brinquedos que lhes entretinham o sono,
das histórias que lhes traziam o riso.
Os filhos já têm filhos, e casas para terem
os filhos, e compromissos para honrar,
e famílias para alimentar. É assim a vida.
Às vezes fala-se, só de passagem, daquilo
qwue um dia ficará para os filhos:
os livros? A casa? O faqueiro de prata?
Tudo tem o seu tempo e a sua lógica.
É um ciclo que se cumpre e se repete.
Já foi assim antes com os pais, com os avós,
com todos os outros, mais longínquos,
de que só os retratos dão notícia, testemunho.
O tempo dos filhos deixou de ser o meu tempo.
Telefonam de longe, mandam postais,
compram pequenas coisas para nos lembrarmos
dos sítios por onde passaram, onde ficaram.
Eles partem e nós ficamos. Eles partem
um pouco mais todos os dias, cumprindo o ciclo,
escalando os degraus velozes de uma escada
que leva sempre mais longe, mais alto.
E nós ficamos fazendo contas aos dias,
acariciando os objectos do primordial afecto,
dos meses mais mansos e mais quentes da infância.
Um dia os filhos falarão assim dos seus filhos,
como quem envelhece recusando o esquecimento.
Os filhos estão sempre de partida, já não ficam,
cresceram, têm pressa, têm as suas vidas,
entram e saem, já não se lembram da cor
dos brinquedos que lhes entretinham o sono,
das histórias que lhes traziam o riso.
Os filhos já têm filhos, e casas para terem
os filhos, e compromissos para honrar,
e famílias para alimentar. É assim a vida.
Às vezes fala-se, só de passagem, daquilo
qwue um dia ficará para os filhos:
os livros? A casa? O faqueiro de prata?
Tudo tem o seu tempo e a sua lógica.
É um ciclo que se cumpre e se repete.
Já foi assim antes com os pais, com os avós,
com todos os outros, mais longínquos,
de que só os retratos dão notícia, testemunho.
O tempo dos filhos deixou de ser o meu tempo.
Telefonam de longe, mandam postais,
compram pequenas coisas para nos lembrarmos
dos sítios por onde passaram, onde ficaram.
Eles partem e nós ficamos. Eles partem
um pouco mais todos os dias, cumprindo o ciclo,
escalando os degraus velozes de uma escada
que leva sempre mais longe, mais alto.
E nós ficamos fazendo contas aos dias,
acariciando os objectos do primordial afecto,
dos meses mais mansos e mais quentes da infância.
Um dia os filhos falarão assim dos seus filhos,
como quem envelhece recusando o esquecimento.
UMA CADELA ENQUANTO ESPERA
A minha cadela nada sabe de
metafísica,
nem dos mistérios que a
palavra encerra
enquanto corre atrás dos
pássaros e das sombras
nos arbustos projectados
sobre a terra batida.
A minha cadela escolhe os
recantos
mais frescos do soalho para
dormir
e sabe que os dias se
repetem iguais e previsíveis,
sensível às ausências e à
rudeza das vozes.
Com ela, a casa parece maior
porque há um fio de afecto a
ligar os quartos,
a unir os gestos, a adoçar
os chamamentos.
A minha cadela nada sabe de
livros
nem dos mistérios que os
povoam,
ignorando até os títulos
daqueles que roeu
enquanto mudava a dentição.
A minha cadela foi precedida por mortes
de outras cadelas que a
doença não poupou
e que eu chorei, como quem
chora sangue do seu sangue.
Sei que espera por mim à
porta, todos os dias,
focinho rente ao chão,
porque sabe
que eu não falto, mesmo que
me atrase.
Amanhã, vou ler-lhe o que
escrevi a seu respeito
e sei que chorará de
comoção, embora
nada saiba de poesia e muito
menos de metafísica.
Há dias em que o cão, nesta
caso a cadela,
é o melhor amigo da poesia,
porque sabe que ela
tem o tamanho do seu coração
quando me espera.
Espero que hajam lido com prazer estes dois poemas e,
quem sabe, nós tenhamos conseguido despertar em vós o desejo de irem comprar o
livro para conhecerem os restantes…
M.A.
ResponderEliminarSão homens como este, que através da sua obra, a cultura existe. Num país onde ela é constantemente varrida para debaixo do tapete.
Li um livro dele, não me lembro do título, era sobre os seus animais, deliciei-me com a descrição dos seus cães e gatos, e do amor que dedicava a cada um.