Só no século IV d.C., grande parte da villa que constituia uma miscelânea entre a primeira e a segunda, foi praticamente demolida, tendo apenas restado alguns alicerces. Uma nova construção foi edificada, desta vez apresentando estruturas de tipo palaciano, que perduraram no tempo até hoje.
O edifício foi abandonado aquando das grandes invasões bárbaras, e só voltou a ser ocupado, mais tarde, por volta do século X d.C., pelos muçulmanos, que fizeram da villa um mosteiro.
De novo abandonado pelos seus ocupantes, aquando da Reconquista Cristã, no século XII, só voltou a ter vida no século XIII, onde se estabeleceu um convento, que permaneceu até ao século XVI e cujo santo padroeiro deu o nome ao edifício que é hoje S. Cucufate.
Apesar de ter sido evacuada provavelmente com a ameaça de ruir, a villa manteve a sua capela, cujo culto foi perpetuado até ao século XVIII. As sucessivas comunidades monásticas que habitaram S. Cucufate souberam, em parte, preservar o património deixado pelos romanos, ao deixarem incólume a residência senhorial, mas arruinaram consideravelmente o espaço destinado à pars rustica, implantando lá um cemitério para os monges, local onde se situava a residência do feitor.
Monumento de valor e extremamente bem conservada, a villa de S. Cucufate ficava situada na circunscrição administrativa de Pax Iulia (Beja), tendo esta cidade sido, provavelmente, a sua grande cliente no mercado do vinho, do pão e do azeite, uma vez que esta produção ficou atestada pela descoberta de grainhas de uvas perto de uns pesos de prensas, e pelo respectivo lagar.
A villa contornada por um ribeiro possuia uma área circundante de terrenos fertéis e cultiváveis, e em redor destes, ricos pastos e bosques. Esta grandiosidade poderia supor que a villa pertenceria a um rico proprietário e que as suas terras constituiam um latifúndio.
Apesar desta suposição, não foram encontradas quaisquer inscrições que revelassem o nome da família, ou famílias, que habitaram a villa, até ao século IV d.C.
A primeira villa
Em local pouco elevado, mas dominando visualmente a paisagem a sul, até Beja, instalou-se em época romana, no séc. I d. C., uma villa, centro de uma exploração agrícola: aí poderia residir o proprietário, organizavam-se os trabalhos necessários à produção, armazenavam-se e transformavam-se os produtos da terra que lhe pertencia.
Foi no decurso deste período, até ao século IV, que a "casa" da primeira instalação se foi progressivamente monumentalizando, tendo passado por duas grandes campanhas de obras.
De muito menores dimensões do que as restantes, a villa apresentava dependências de índole agrícola, cujas divisões serviam, por um lado, de armazéns e de salas de arrumação, e por outro, de espaço habitacional dos proprietários, não existindo, assim, uma distinção patente entre os dois espaços (rural e urbano) constituindo a villa uma quinta relativamente modesta, cujo pátio central, bastante amplo, permitia a entrada para a casa do proprietário, que por sua vez, circundava um pequeno quintal situado nas vertentes sul e oeste da villa.
A pars rustica estaria distribuida pelas fachadas sul e norte, ou seja, dos lados paralelos ao pátio central, e nas imediações da pars urbana.
A segunda villa
Por volta da primeira metade do século II d.C., a villa de São Cucufate sofreu grandes transformações arquitectónicas e ampliou as suas dimensões para cerca do dobro. Possuia novas comodidades próprias ao estilo de vida que os cidadãos romananos cada vez mais fomentavam. Isto também tendo em consideração que os rendimentos económicos provenientes da comercialização dos produtos agrícolas tivessem progredido consideravelmente.
A ligação das villae produtoras com as cidades consumidoras possibilitou não só esse aumento de capitais como o próprio estilo de propriedade foi influenciado pelo ritmo de vida das metrópoles.
Desta feita, a vila foi reconstruída a partir do modelo de casa de peristilo. Na fachada sul, estavam instaladas as termas e as dependências agrícolas, entre as quais um lagar e os armazéns. O complexo termal situava-se na vertente oeste e a villa rustica na vertente leste. A pars urbana estendia-se em volta do peristilo, mas apenas circundando-o de três lados, formando um quadrado, quando o quarto lado constituia a villa rustica.
A Norte, um grande tanque rectangular servia de reservatório, cujas águas eram abastecidas por um aqueduto. Com uma capacidade de 800 metros cúbicos, este tanque assegurava água corrente para a residência senhorial, para a pars rustica, para as termas e para a irrigação de jardins, hortas e pomares.
A villa áulica
Após a destruição da villa anterior, foi de novo edificada uma construção cujos critérios arquitectónicos se elevaram ao máximo do requinte e do luxo, que fizeram de S. Cucufate uma villa de tipo palaciano.
O século IV d.C. testemunhava uma riqueza latifundiária que permitiu esse incremento espacial. Foi neste sentido que uma nova dependência surgiu, a sul, construída de raíz.
A villa de São Cucufate é uma construção rectangular de cerca de 105 por 25 metros, construída em dois pisos. O inferior abobadado poderia servir para armazéns e alojamento dos criados domésticos; o piso superior, de que se conservam alguns pavimentos, servia de residência ao proprietário e sua família. A fachada apreenta um longo patamar descoberto, ao qual se sobe por três escadarias. Este patamar, situado no rés-do-chão, embora mais alto que o nível do piso térreo, mediava, de cada lado duas imponentes aberturas em forma de torreão abobadado, e sua própria configuração faz lembrar a de um palco de grandes dimensões. Essa fachada conduzia a um segundo patamar, já coberto, que se abria para um jardim na rectaguarda, cujo espaço compreendia o antigo tanque da villa II que abastecia todas as dependências e irrigava o jardim circundante.
O primeiro andar da villa urbana era destinado à residência dos proprietários. As paredes parecem ter sido de mármore e o chão revestido por mosaicos. Uma varanda dava acesso à entrada nos quartos, ao terraço situado por cima de uma das torres e à entrada num salão situado no lado oposto da casa.
Apesar de persistir o pequeno tanque semi-circular do antigo peristilo, este último desapareceu, ou pelo menos foi incorporado num sector que pertencia à residência do feitor, tendo, deste modo, perdido toda a sua importância. A villa apresentava, ainda, a Leste, uma pars rustica inteiramente dedicada a oficinas, lagares, armazéns e instalações para os criados. Comportava ainda umas termas para estes últimos e para o villicus.
Existe um aspecto curioso nesta villa. Uma parte que estaria destinada a uma sala de recepção e a umas termas não foi concluída, tendo restado apenas os seus alicerces. Não se sabe o motivo deste abandono, conjectura-se, contudo, que a falta de orçamento o tenha possibilitado.
A Sul, um outro tanque de grandes dimensões servia a villa, e próximo deste, um templo que foi cristianizado, mais tarde, serve de entrada à imponente villa, cuja história e ruínas constituem um perfeito exemplo arqueológico do que foi, há muito tempo, uma propriedade romana que se elevou às custas de uma exploração rural e comercial no Alto Império.
Espólio
O espólio das escavações realizadas por uma equipa luso-francesa liderada por Jorge de Alarcão, R. Étienne e F. Maeyt estão trancados em depósito na Câmara Municipal da Vidigueira. Atendendo ao interesse da sua divulgação para um mais vasto conhecimento do local, espera-se que a promessa que anuncia a sua exposição na Casa do Arco, em Vila de Frandes, possa ser, em breve, uma realidade.
As ruínas de S. Cucufate estão abertas de quarta-feira a domingo, das 9h00 às 12h00 e das 14h00 às 17h00; terça--feira, das 14h30 às 17h00. Encerra à segunda-feira e nos feriados de 1 de Janeiro, Sexta-Feira Santa, Domingo de Páscoa, 1 de Maio e 25 de Dezembro.
Tel:284 441 113
fc
Nota : Fernando obrigada por este contributo
5 comentários:
Conheço S.Cucufate só de nome mas este post, Fátima fez-me criar apetência para lá ir. Bom trabalho. Parabéns.
Acabei de viajar ao passado…
Visitei as ruínas numa excursão escolar há mais de 15 anos atrás e nunca mais regressei…
Como o tempo passa…
Adorei!
Existem umas ruínas ali perto de Caxias, que até tem uma vivenda em ruínas perto.
Mesmo frente ao mar.
Sabem o que é?
Francisca
Temos de explorar essas ruínas, antes que plantem um condomínio fechado. Não é díficil lá chegar, pois ficam muito perto da nossa localidade,
Red as ruínas a que te referes, são da Quinta da Boa Viagem. O Edificio em ruínas funcionou durante muitos anos como salão de chá. Para aquele espaço ao que sei está prevista uma requalificação/Intervenção, que prevê a construção de 3 edifícios, 1 hotel, e um pavilhão multiusos.
Quanto à história do local, ainda não consegui muito mais, nas vou continuar a procurar.
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