Este, é o nome dado a um famoso documento que figura hoje emoldurado em muitos escritórios de advogados e bares do Nordeste brasileiro.
Na Paraíba, em 1955, alguns elementos boémios faziam uma serenata e foram presos. Eles foram libertados no dia seguinte, mas o violão ficou retido. Tomando conhecimento do acontecido, o famoso poeta e senador Ronaldo Cunha Lima enviou uma petição ao Juiz da Comarca, em verso, solicitando a entrega do instrumento musical:
Senhor Juiz
Roberto Pessoa de Sousa:
O instrumento do “crime” que se arrola
Nesse processo de contravenção
Não é faca, revolver ou pistola,
Simplesmente Doutor, é um violão.
Um violão, Doutor, que em verdade…
Não feriu nem matou um cidadão
Feriu, sim, mas a sensibilidade
De quem o ouviu vibrar na solidão.
O violão é sempre uma ternura,
Instrumento de amor e de saudade
O crime a ele nunca se mistura
Entre ambos inexiste afinidade
O violão é próprio dos cantores
Dos menestréis de alma enternecida
Que cantam mágoas que povoam a vida
E sufocam as suas próprias dores.
O violão é música e é canção
É sentimento, é vida, é alegria
É pureza e é néctar que extasia
É adorno espiritual do coração.
Seu viver, como o nosso, é transitório.
Mas seu destino, não, se perpetua.
Ele nasceu para cantar na rua
E não para ser arquivo de Cartório.
Ele, Doutor que suave lenitivo
Para a alma da noite em solidão,
Não se adapta, jamais, em um arquivo
Sem gemer sua prima e seu bordão
Mande entregá-lo, pelo amor da noite
Que se sente vazia em suas horas,
Para que volte a sentir o terno açoite
De suas cordas finas e sonoras.
Liberte o violão, Doutor Juiz,
Em nome da Justiça e do Direito.
É crime, porventura, o infeliz
Cantar as mágoas que lhe enchem o peito?
Será crime, afinal, será pecado,
Será delito de tão vis horrores,
Perambular na rua um desgraçado,
Derramando na praça suas dores?
Mande pois libertá-lo da agonia
(a consciência assim nos insinua)
Não sufoque o cantar que vem da rua,
Que vem da noite para saudar o dia.
É o apelo que lhe dirigimos,
Na certeza do seu acolhimento
Juntada desta aos autos, nós pedimos
E pedimos, enfim, deferimento.
O Juiz Roberto Pessoa de Sousa, por sua vez despachou utilizando a mesma linguagem do poeta Ronaldo Cunha Lima: o verso popular.
Recebo a petição escrita em verso
E, despachando-a sem autuação,
Verbero o acto vil, rude e perverso,
Que prende, no Cartório, um violão.
Emudecer a prima e o bordão,
Nos confins de um arquivo, em sombra imerso,
É desumana e vil destruição
De tudo o que há de belo no universo.
Que seja Sol, ainda que a desoras,
E volte à rua, em vida transviada,
Num esbanjar de lágrimas sonoras.
Se grato for, acaso ao que lhe fiz,
Noite de luz, plena madrugada,
Venha tocar à porta do Juiz.
Nota-Digam lá que não é um encanto isto que leram? Se clicarem aqui terão oportunidade de ouvir também um bonito solo de violão que acompanha este poético relato, ainda que não completo na parte que pertence à sentença do Juiz.
M.A.
Na Paraíba, em 1955, alguns elementos boémios faziam uma serenata e foram presos. Eles foram libertados no dia seguinte, mas o violão ficou retido. Tomando conhecimento do acontecido, o famoso poeta e senador Ronaldo Cunha Lima enviou uma petição ao Juiz da Comarca, em verso, solicitando a entrega do instrumento musical:
Senhor Juiz
Roberto Pessoa de Sousa:
O instrumento do “crime” que se arrola
Nesse processo de contravenção
Não é faca, revolver ou pistola,
Simplesmente Doutor, é um violão.
Um violão, Doutor, que em verdade…
Não feriu nem matou um cidadão
Feriu, sim, mas a sensibilidade
De quem o ouviu vibrar na solidão.
O violão é sempre uma ternura,
Instrumento de amor e de saudade
O crime a ele nunca se mistura
Entre ambos inexiste afinidade
O violão é próprio dos cantores
Dos menestréis de alma enternecida
Que cantam mágoas que povoam a vida
E sufocam as suas próprias dores.
O violão é música e é canção
É sentimento, é vida, é alegria
É pureza e é néctar que extasia
É adorno espiritual do coração.
Seu viver, como o nosso, é transitório.
Mas seu destino, não, se perpetua.
Ele nasceu para cantar na rua
E não para ser arquivo de Cartório.
Ele, Doutor que suave lenitivo
Para a alma da noite em solidão,
Não se adapta, jamais, em um arquivo
Sem gemer sua prima e seu bordão
Mande entregá-lo, pelo amor da noite
Que se sente vazia em suas horas,
Para que volte a sentir o terno açoite
De suas cordas finas e sonoras.
Liberte o violão, Doutor Juiz,
Em nome da Justiça e do Direito.
É crime, porventura, o infeliz
Cantar as mágoas que lhe enchem o peito?
Será crime, afinal, será pecado,
Será delito de tão vis horrores,
Perambular na rua um desgraçado,
Derramando na praça suas dores?
Mande pois libertá-lo da agonia
(a consciência assim nos insinua)
Não sufoque o cantar que vem da rua,
Que vem da noite para saudar o dia.
É o apelo que lhe dirigimos,
Na certeza do seu acolhimento
Juntada desta aos autos, nós pedimos
E pedimos, enfim, deferimento.
O Juiz Roberto Pessoa de Sousa, por sua vez despachou utilizando a mesma linguagem do poeta Ronaldo Cunha Lima: o verso popular.
Recebo a petição escrita em verso
E, despachando-a sem autuação,
Verbero o acto vil, rude e perverso,
Que prende, no Cartório, um violão.
Emudecer a prima e o bordão,
Nos confins de um arquivo, em sombra imerso,
É desumana e vil destruição
De tudo o que há de belo no universo.
Que seja Sol, ainda que a desoras,
E volte à rua, em vida transviada,
Num esbanjar de lágrimas sonoras.
Se grato for, acaso ao que lhe fiz,
Noite de luz, plena madrugada,
Venha tocar à porta do Juiz.
Nota-Digam lá que não é um encanto isto que leram? Se clicarem aqui terão oportunidade de ouvir também um bonito solo de violão que acompanha este poético relato, ainda que não completo na parte que pertence à sentença do Juiz.
M.A.
2 comentários:
Como seria o nosso Mundo se tudo fosse tratado com um som de Violão e umas poesia.
Claro que isto é utopia, mas muita coisa poderia ser esolvida com umas palavras e um sorriso.
Um abraço
Clotilde
Clotilde seja bem aparecida por aqui!
Há muito tempo que não tinhamos o prazer dos seus comentários.
Subscrevo a sua ideia.
Um abraço
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