Como tudo começou

22/08/08

CONFISSÃO DE UMA MULHER

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Pareceu-me ser este o título adequado para um, pouco divulgado, episódio da vida da nossa Rainha D. Amélia de Orleães e Bragança (1865-1951) que aparece relatado no livro mencionado abaixo. É um livro de memórias baseado em documentos inéditos dos arquivos da Casa de França e, no diário íntimo e correspondência da nossa última rainha. Esta obra aparece quase toda escrita em discurso directo.


"…Há dores íntimas, aquelas que uma rainha não confia nunca enquanto cumpre o seu dever de Estado, mas que uma mulher pode confessar quando chega ao crepúsculo da vida. Entre tantos lutos, há um que usei em segredo até hoje.
Há cerca de meio século que Joaquim Augusto Mouzinho de Albuquerque pôs fim aos seus dias, mais exactamente no dia 8 de Janeiro de 1902. Como todos os portugueses, eu admirava aquele magnífico oficial de cavalaria que fora governador geral de Moçambique e vencera os rebeldes de Gungunhana na Batalha decisiva de Coolela. Quando este herói voltara a Portugal, em 1897, tínhamos ido esperá-lo ao Arsenal, Carlos, as crianças e eu. Desembarcara da escuna real como um personagem lendário, aureolado de glória, exactamente como aqueles cavaleiros que eu via nos livros de imagens quando criança."

Segue-se uma descrição da entrega da Medalha de Valor Militar a Mouzinho,a partida dele para o estrangeiro, em algumas missões diplomáticas, nova ida para Moçambique como Governador e o regresso a Portugal. Fiz a abreviação para não alongar demasiado este apontamento.

"O rei nomeou-o seu ajudante-de-campo e preceptor do meu pequeno Luís. É evidente que nos encontrávamos muitas vezes. Nasceu em nós uma amizade plena de confiança, ainda mais profunda, na medida em que ambos éramos alvo das intrigas da Corte e das armadilhas políticas. Alguns acusavam-no de querer tornar-se ditador, outros tentavam arrastá-lo para um conluio político com João Franco.
Joaquim Augusto era demasiado inteligente para não sofrer com as campanhas políticas dirigidas contra ele, e demasiado militar para suportar as tolices e invejas da Corte. Contava-me os seus tormentos. Eu tentava reconfortá-lo, dizendo-lhe ao mesmo tempo porque podia compreendê-lo tão bem. Falávamos da educação do Pequeno, que ele amava ternamente. Também dávamos longos passeios a cavalo, sem pronunciar palavra, mas numa perfeita comunhão de almas. O seu respeito de fidalgo deixava por vezes transparecer uma pontinha de ternura. A minha estima por ele aproximava-se da afeição.
Creio bem que, na solidão da tapada, nos sentimos várias vezes atraídos um pelo outro.
No dia em que me vieram dizer que metera uma bala na cabeça, senti um desmoronamento íntimo, ainda mais atroz por nada poder deixar transparecer. Esperei pela calada da noite para poder chorar.
O desgosto nunca me abandonou, e a ele vem acrescentar-se o tormento de não compreender porque é que Joaquim se suicidou, no auge da glória, protegido pelo rei, amado pela rainha? Não acredito num acto romântico, apesar das ligações que mantinha com os escritores portugueses que se auto designavam 'Os Vencidos da Vida' Talvez estivesse desgostoso com o meio político e, sei que não suportava as campanhas de intrigas que o davam como meu amante. Durante muito tempo, tentei iludir a cruel verdade. Creio compreender neste momento que Joaquim se matou para nos evitar aquilo que os rumores espalhavam como certo, e que poderia ter atentado contra a minha honra. Salvou-me de mim própria, pois não posso jurar que teria tido a força de resistir. Na sua infinita misericórdia, Deus perdoar-lhe-á o seu sacrifício."

(Retirado do livro” Eu, Amélia, Última Rainha de Portugal” de Stéphane Bern , saído em Maio de 1999)

M.A.

4 comentários:

Anónimo disse...

Assisti ao funeral da rainha D. Amélia, empoleirada na janela da casa do meu avô materno, na Graça.
Tinha uns seis anos, lembro-me de muita gente a acompanhar a carruagem. Não tenho a certeza se era ou não uma carruagem.
Como todas as crianças da minha geração os reis e as rainhas, eram pessoas encantadoras, por isso, esta rainha tinha a minha simpatia.

Anónimo disse...

Anónimo não.

Anónimo disse...

Não li este livro, mas acho que vai ser uma das minhas proximas leituras.
Obrigada Amelia!

Patti disse...

Tenho este livro há mais de 4 anos e ainda não o li. É leitura de Inverno, vamos ver se será neste.
Bjs.

Sociedade de Instrução Musical e Escolar Cruz Quebradense

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