Como tudo começou

10/02/11

MÁQUINAS DE ESCREVER, UMA VEZ MAIS

GIUSEPPE GHIARONI



Pela segunda vez estamos com o tema máquinas de escrever. Para recordar o que foi dito na primeira, convidamos quem nos lê , a clicar aqui.
O vídeo que trazemos mostra máquinas de escrever que são já verdadeiras relíquias. Quando, hoje em dia, escrevemos no computador, dificilmente nos lembramos que, em tempos idos, para idêntica função, se utilizava um objecto destes!




Como curiosidade, vou contar-vos um episódio passado connosco e que, de certo modo, se relaciona com este assunto:
Numa ida a Paris, em 1987, compramos uma máquina de escrever electrónica. Foi para nós uma surpresa e, as inovações que trazia, quando comparada com as máquinas de escrever tradicionais, eram já bastante consideráveis. Acreditem que era mesmo um “brinquedo de encanto”.
Tempo depois, porque se estavam a esgotar as cassetes da fita nela utilizada, procuramo-las em Lisboa, sem resultado. Pelo telefone continuamos o contacto com diversas firmas e, numa delas, o senhor que nos atendeu, após ouvir os dados da máquina e o que se pretendia, um tanto agastado, disse-nos:
«_Ora esta, como quer a srª comprar uma coisa para uma máquina que nem está ainda à venda em Portugal?»
Então, ao nosso jeito, respondemos-lhe: «_Talvez tenha razão mas, se me dá licença e isso o não incomoda… informo-o que tenho uma máquina dessas e, portanto, procuro cassetes para ela!»
A conversa mudou logo de tom. O homem tornou-se mais simpático e, foi é buscar todos os argumentos que tinha e. mais alguns ainda, para nos convencer a vender-lhe a dita máquina, porque já ouvira falar dela e tinha imensa vontade de possuir uma!...

Quando já imaginávamos ter que mandar vir de fora as ditas fitas houve, finalmente, a sorte de encontrar uma única embalagem (penso que de uma dúzia de cassetes), numa firma até bem próximo de nossa casa.
Alguém lhes fizera a encomenda, fora feita a importação e, depois, como não apareceram a levantá-la, veio então parar às minhas mãos.
Hoje, leitores, até esta “neta” das que aparecem no vídeo e que era uma novidade em 1987, já está, também ela, em descanso, destronada pelo computador!
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Por razões técnicas na conversão para vídeo, foram abreviados os tempos de exposição dos slides onde aparece o Poema de GIUSEPPE GHIARONI
que abaixo se transcreve.
Se desejar conhecer dados biográficos deste autor queira clicar aqui.

MÁQUINA DE ESCREVER

Mãe, se eu morrer de um repentino mal,
vende meus bens a bem dos meus credores:
a fantasia de festivas cores
que usei no derradeiro Carnaval.

Vende também meus óculos antigos
que me davam uns ares inocentes.
Já não precisarei de duas lentes
para enxergar os corações amigos.

Vende , além das gravatas, do chapéu,
meus sapatos rangentes.
Sem ruído é mais provável que eu alcance o Céu
e logre penetrar despercebido.
Vende meu dente de ouro.
O Paraíso requer apenas a expressão do olhar.
Já não precisarei do meu sorriso
para um outro sorriso me enganar.

Vende meus olhos a um brechó qualquer
que os guarde numa loja poeirenta,
reluzindo na sombra pardacenta,
refletindo um semblante de mulher.
Vende tudo, ao findar a minha sorte,
libertando minha alma pensativa
para ninguém chorar a minha morte
sem realmente desejar que eu viva.
Pode vender meu próprio leito
e roupa para pagar àqueles a quem devo.
Sim, vende tudo, minha mãe,
mas poupa esta caduca máquina em que escrevo.

Mas poupa a minha amiga de horas mortas,
de teclas bambas, tique-taque incerto.
De ano em ano, manda-a ao conserto
e unta de azeite as suas peças tortas.
Vende todas as grandes pequenezas
que eram meu humílimo tesouro,
mas não! ainda que ofereçam ouro,
não venda o meu filtro de tristezas!
Quanta vez esta máquina afugenta
meus fantasmas da dúvida e do mal,
ela que é minha rude ferramenta,
o meu doce instrumento musical...

Bate rangendo, numa espécie de asma,
mas cada vez que bate é um grão de trigo.
Quando eu morrer, quem a levar consigo
há de levar consigo o meu fantasma.
Pois será para ela uma tortura
sentir nas bambas teclas solitárias
um bando de dez unhas usurárias
a datilografar uma fatura.

Deixa-a morrer também quando eu morrer;
deixa-a calar numa quietude extrema,
à espera do meu último poema
que as palavras não dão para fazer.
Conserva-a, minha mãe, no velho lar,
conservando os meus íntimos instantes,
e, nas noites de lua, não te espantes
quando as teclas baterem devagar.

Que este post tenha sido do vosso agrado.
Até breve, leitores.
M.A.

3 comentários:

Quica disse...

Verdadeiras relíquias, ultrapassadas pelas novas tecnologias só as gerações dos anos 40, 50 e talvez os de 60 se lembrem delas.

O poema é lindíssimo.

maria clotilde Moreira disse...

Um dia contarei a minha história de aprender a escrever à máquina. Gostei destas recordações
Clotilde

M.A. disse...

Quica:
Não deixando de olhar o futuro sabe sempre bem recordar estas relíquias do passado. Volte sempre. Abraços

Clotilde:
Ficaremos à espera dessa história que acreditamos tenha bastante interesse. Pela minha parte sempre tive acesso a máquinas de escrever e então vá escrevinhar tudo e mais um par de botas.Comecei com o teclado AZERT mas mais tarde entenderam que devia aprender antes no HCESAR, já que se acreditava ser o que perduraria no tempo. Afinal veio o computador e modificou-se tudo... Volte sempre. Abraços.

Sociedade de Instrução Musical e Escolar Cruz Quebradense

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